segunda-feira, 26 de outubro de 2009

O futuro do Movimento Lisboa com Carmona

(Excerto do capítulo 9 do livro “Movimento Lisboa com Carmona. Uma experiência de Participação Democrática”, lançado a 22 de Setembro)
"Futuro
A participação de listas de independentes em eleições tem sido vista, tanto em Portugal como no estrangeiro, como uma anomalia do sistema democrático e partidário. Tal deve-se, na óptica do Movimento Lisboa com Carmona, a um insuficiente grau de maturidade do próprio sistema político, que parece não estar ainda preparado para aceitar este fenómeno de forma natural e mesmo positiva para a própria democracia.
Muitas vezes, os independentes são convidados a participar em listas de partidos para dar uma imagem de pluralidade e abertura à chamada sociedade civil, mas a experiência deixa também frequentemente a sensação de que se tratam mais de operações de marketing político do que de uma genuína vontade de alargamento partidário a personalidades com sensibilidades diferentes.
Por outro lado, existe uma percepção enraizada em grande parte da população que os partidos ocupam o panorama político em regime de exclusividade, vendo nos movimentos independentes como que uma intrusão de “corpos” estranhos sob a forma de agrupamentos políticos não partidários.
Apesar disso, no futuro próximo, e enquanto perdurar um certo sentimento de desencanto geral com a actuação de alguns partidos, creio que haverá lugar a uma natural aceitação por parte do eleitorado à participação de movimentos de independentes em actos eleitorais. Na realidade, e em particular nas eleições autárquicas, a figura pessoal do candidato tem mostrado ser tão ou mais importante do que o quadrante político em que se insere.

No que diz respeito ao Movimento Lisboa com Carmona, foi tomada a decisão de não repetir a candidatura às eleições autárquicas de 2009, pelas razões que atempadamente foram expostas, apesar de inúmeras expressões de apoio provenientes dos mais diversos sectores. No entanto, foi também entendido que o espírito e a imagem criados à volta da actividade dos membros do Movimento ao longo destes anos não permitiriam que o mesmo terminasse com a sua ligação à cidade.
Deste modo, foi decidido que o Movimento Lisboa com Carmona continue a sua actividade de participação cívica e democrática, através de uma associação a constituir para o efeito. Esta associação dará prioridade a todas as iniciativas de intervenção, discussão e participação que digam respeito a temas do interesse dos lisboetas.

Lisboa é uma cidade que tem ainda muitos desafios pela frente. Tem problemas que vêm do passado e tem de se preparar para o futuro. Do passado, subsistem alguns problemas de reabilitação urbana, de mobilidade e transportes, de inclusão social e de alguma insegurança. Lisboa tem de trilhar o percurso da sustentabilidade e da competitividade, procurando a melhor forma de organização do universo dos seus serviços. Mas Lisboa não pode conseguir tudo isso sem uma alteração do quadro actual de governabilidade.
O Movimento Lisboa com Carmona tem-se batido, como nenhum outro, pelo estatuto de capitalidade que Lisboa tem de ter. Não tem só a ver com os custos que essa capitalidade tem implicado para a cidade, no passado e no presente. Tem essencialmente a ver com as condições de afirmação e de desenvolvimento que uma cidade como Lisboa, capital de Portugal, centro da maior área metropolitana do País, sede dos poderes legislativo, executivo e judicial, deve ter.
Para isso, será da maior importância que se comece por entender que a Área Metropolitana de Lisboa deverá ter um estatuto diferente do actual. O órgão que representa a área metropolitana deverá ser legitimado pelo voto directo das populações e ser dotado de meios humanos e financeiros para poder desenvolver a sua actividade. Este órgão deverá ter competências próprias, que serão naturalmente transferidas do poder central ou do poder local. Questões como o ambiente, os transportes ou os principais equipamentos de saúde ou de ensino podem e devem ser mais bem planeadas e desenvolvidas a nível metropolitano do que a nível de cada um dos municípios.
Por outro lado, esta reforma administrativa deverá ser acompanhada por uma revisão do quadro actual das freguesias e das suas competências. O Movimento Lisboa com Carmona sempre defendeu uma maior capacidade de intervenção das freguesias junto das populações que servem, sendo que para isso será necessário ponderar a melhor forma de gestão administrativa adequada à concretização desse objectivo.
Mas para a governabilidade da cidade é cada vez mais urgente alterar a Lei Autárquica que, do ponto de vista do Movimento, está completamente desajustada da realidade. De facto, a lei, tal como está, contribui ela própria para uma governabilidade mais difícil, para uma menor capacidade da cidade resolver os seus problemas. A grande maioria dos países democráticos adoptou há muito um modelo diferente, tendo havido num passado recente em Portugal algumas iniciativas para se alterar a lei autárquica, mas sem sucesso.
A legitimidade de quem ganha as eleições deve permitir ao candidato vencedor, no entendimento do Movimento, escolher a sua equipa governativa dentro de um executivo monocolor, à semelhança aliás do que se passa para a formação do Governo da República. Por outro lado, a Assembleia Municipal, como principal órgão fiscalizador da actividade do executivo, deverá ter também uma actividade mais responsabilizada e prestigiada junto da população.

Em síntese, a sociedade tem de se saber adaptar às novas dinâmicas, à celeridade com que ocorrem novas situações e novos desafios, que temos de saber por vezes antecipar e dar-lhes resposta atempada. Para isso, e sempre que se justifique, há que questionar sem complexos os modelos existentes, discutir os caminhos possíveis e decidir o rumo a tomar. Bons exemplos nos têm sido dados por outros países bem próximos do nosso em matéria de governância. Não nos podemos conformar com situações que bloqueiam o nosso desenvolvimento e não sermos capazes de promover as mudanças necessárias.
Para isso, tem de haver uma participação e um envolvimento alargado das populações. O papel dos partidos políticos é insubstituível, mas a dinâmica induzida por grupos de independentes só poderá acrescentar qualidade e valor à nossa vida democrática."